Extensão da legitimidade ativa no controle concentrado de constitucionalidade
O artigo 103, da CRFB/88, prevê os legitimados para a propositura de ações no controle concentrado de constitucionalidade. Podem ser divididos em duas categorias, conforme a prática do Supremo Tribunal Federal.
Os legitimados universais são: Presidente da República (103, I); a Mesa do Senado Federal (II); a Mesa da Câmara dos Deputados (III); o Procurador-Geral da República (VI); o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (VII); e o partido político com representação no Congresso Nacional (VIII). Os demais são legitimados especiais: a Mesa de Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal (IV); o Governador de Estado ou do Distrito Federal (V) E confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional (IX).
Para os segundos, vale a explicação: são especiais porque devem guardar uma relação de pertinência temática entre seus fins e propósitos com o objeto da ação. Configura-se, portanto, um ônus processual.
Atenção maior dá-se à parte final do inciso IX, do artigo 103, da CRFB/88. Mesmo diante de uma compreensão mais geral sobre “entidade de classe de âmbito nacional”, caracterizada como aquela que possui “o mesmo objetivo institucional de defesa dos interesses de uma determinada classe” (ADI 3153 AgR, Rel. Min. Celso De Mello, j. 2004), o STF afunilou o sentido para os representantes dos que desempenham mesma atividade econômica e profissional.
Como forma de jurisprudência defensiva, são aplicadas, ainda, outras condicionantes processuais: “homogeneidade entre os membros integrantes da entidade; e a representatividade da categoria em sua totalidade e comprovação do caráter nacional da entidade, pela presença efetiva de associados em, pelo menos, nove estados-membros” (ADI 4384 AgR – Rel. Min. Luiz Fux, j. 2019).
Contudo, recentes julgados da Corte indicam uma postura de superação parcial da jurisprudência para ampliar o conceito de “entidade de classe de âmbito nacional”. Diante disso, passa a entender como “o conjunto de pessoas ligadas por uma mesma atividade econômica, profissional ou pela defesa de interesses de grupos vulneráveis e/ou minoritários cujos membros as integrem” (ADPF 709, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJ 07.10.2020. ADPF 527, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, j. 02.07.2018; e ADI 5291, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 06.05.2015).
A extensão da legitimidade significou que diversos agentes da sociedade civil pudessem ter acesso ao STF para a defesa de seus interesses, tais como dos direitos das pessoas LGBTI (ADPF 527/DF), dos direitos dos povos indígenas (ADPF 709/DF) e dos direitos dos consumidores (ADI 5291/DF).
Para uma formulação de uma teoria de igual proteção, Owen Fiss, conquanto atentando-se para o contexto norteamericano sobre afrodescendentes, aponta três características importantes que podem ser consideradas sobre grupos desfavorecidos ou em desvantagem em geral: “a) constituem um grupo social; b) o grupo esteve em situação de subordinação prolongada; c) o poder político do grupo encontra-se severamente limitado. ” – ver Derecho y grupos desaventajados, sob coordenação de Gargarella, 1999.
Para desmistificar o temor sobre a possibilidade de um aumento no volume de processos em controle de constitucionalidade e, ainda, uma reflexão sobre quem tem, em alguma medida, acesso ao órgão de cúpula do Poder Judiciário brasileiro, o estudo “A quem interessa o controle concentrado de constitucionalidade ?” pode ajudar com questionamento de primeira ordem.
A mudança de posicionamento parece importante ao conferir maior abertura para uma democracia participativa, além da tutela do direito objetivo e uma defesa normativa da Constituição, especialmente em relação aos direitos fundamentais.